O Pós-Tribulacionismo à Luz das Escrituras: Uma Análise da Volta de Cristo


A escatologia, um dos ramos da teologia, trata dos eventos finais e da segunda vinda de Cristo. Entre as várias perspectivas escatológicas, o Pós-Tribulacionismo se destaca como uma interpretação que postula que a volta de Cristo ocorrerá após a Grande Tribulação. Embora as formulações exatas possam variar, a ideia de que a segunda vinda de Cristo ocorrerá após a tribulação já era presente em alguns escritos e crenças dentro da igreja primitiva e nos primeiros Pais da Igreja. Vamos explorar um breve histórico desse ponto de vista:

Igreja Primitiva:

Na igreja primitiva, havia uma expectativa forte de que Cristo retornaria. A linguagem apocalíptica presente nas escrituras influenciou a crença de que um tempo de tribulação precederia a volta de Cristo. Algumas passagens bíblicas, como Mateus 24 , deram origem a uma interpretação pós-tribulacionista entre os primeiros crentes.

Justino Mártir (100-165 d.C.):

Embora não seja possível afirmar com certeza que Justino Mártir fosse pós-tribulacionista, alguns de seus escritos indicam uma compreensão da ressurreição e da volta de Cristo que poderia ser alinhada com essa perspectiva. Ele menciona a ressurreição ocorrendo após o reinado do Anticristo.

Tertuliano (160-225 d.C.):

Tertuliano, um importante teólogo da igreja primitiva, parece compartilhar uma visão que sugere um arrebatamento dos crentes após a tribulação, que ele identifica como uma perseguição final.

Efrém da Síria (306-373 d.C.):

Efrém, um teólogo e pregador siríaco, também pode ter defendido uma visão pós-tribulacionista. Ele escreveu sobre a volta de Cristo após a tribulação, mas suas obras são muitas vezes complexas e interpretativas.

Agostinho de Hipona (354-430 d.C.):

Agostinho, um dos teólogos mais influentes da história, parece ter defendido uma visão pós-tribulacionista em algumas de suas obras, embora sua posição possa não ser totalmente clara.

Outros Pais da Igreja:

Outros Pais da Igreja, como Lactâncio, também podem ter mantido uma perspectiva semelhante, mas a interpretação desses escritos muitas vezes depende da análise cuidadosa de seus contextos e nuances.

Em resumo, enquanto não há um registro extenso e claro da perspectiva pós-tribulacionista nos escritos dos Pais da Igreja primitiva, algumas passagens e comentários indicam que a ideia de que a volta de Cristo ocorrerá após a tribulação estava presente de alguma forma. Essa perspectiva continuou a ser explorada e debatida ao longo da história da Igreja, moldando a maneira como os crentes enxergam os eventos finais. Esta visão é fundamentada em uma análise exegética de várias passagens bíblicas que abordam a cronologia dos eventos finais e a parousia, a vinda de Cristo.

 A Base Bíblica do Pós-Tribulacionismo

Uma das passagens centrais para o Pós-Tribulacionismo encontra-se em Mateus 24, conhecido como o Discurso do Monte das Oliveiras. Neste capítulo, Jesus responde à pergunta dos discípulos sobre o sinal de Sua vinda e o fim dos tempos. Ele descreve uma série de eventos, incluindo a tribulação, a abominação da desolação e sinais celestiais impressionantes. Em Mateus 24:29-31, O Senhor Jesus declara:

"Logo em seguida à tribulação daqueles dias, o sol escurecerá, a lua não dará a sua claridade, as estrelas cairão do firmamento, e os poderes dos céus serão abalados. Então, aparecerá no céu o sinal do Filho do Homem, e todas as nações da terra se lamentarão e verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu, com poder e muita glória. E ele enviará os seus anjos, com grande clangor de trombeta, os quais lhe reunirão os escolhidos dos quatro ventos, de uma a outra extremidade dos céus."

1 Coríntios 15:52 - "Num momento, num abrir e fechar de olhos, ao ressoar da última trombeta. A trombeta soará, os mortos ressuscitarão incorruptíveis, e nós seremos transformados."

Esta passagem é frequentemente associada ao arrebatamento. O Pós-Tribulacionismo vê a "última trombeta" como referência ao momento da volta de Cristo após a tribulação, quando os crentes serão transformados.

2 Tessalonicenses 2:1-3- "No que se refere à vinda de nosso Senhor Jesus Cristo e à nossa reunião com ele, nós vos exortamos, irmãos, a que não vos demovais da vossa mente, com facilidade ou alarmados, seja por espírito, seja por palavra, seja por epístola como enviada por nós, como se o Dia do Senhor já estivesse aqui. Ninguém, de maneira alguma, vos engane."

O Pós-Tribulacionismo argumenta que o "Dia do Senhor" mencionado aqui se refere a uma série de eventos que culminam na vinda de Cristo após a tribulação.

Mateus 13:30, 39-43 - "Deixai-os crescer juntos até à colheita, e, por ocasião da colheita, direi aos ceifeiros: Ajuntai primeiro o joio e atai-o em molhos para o queimar; o trigo, porém, recolhei-o no meu celeiro... O inimigo que o semeou é o diabo; a ceifa é o fim do mundo; os ceifeiros são os anjos. Pois assim como o joio é colhido e lançado no fogo, assim será na consumação do mundo. Mandará o Filho do Homem os seus anjos, e eles ajuntarão do seu reino todos os escândalos e os que praticam a iniqüidade, e os lançarão na fornalha acesa; ali haverá choro e ranger de dentes. Então, os justos resplandecerão como o sol, no reino de seu Pai. Quem tem ouvidos [para ouvir], ouça."

Nesta parábola do joio e do trigo, o Pós-Tribulacionismo vê o processo de separação acontecendo após a tribulação, quando os justos serão glorificados e os ímpios serão julgados.

Apocalipse 20:4-6 - "E vi tronos; e assentaram-se sobre eles, e foi-lhes dado o poder de julgar; e vi as almas daqueles que foram degolados pelo testemunho de Jesus e pela palavra de Deus e que não adoraram a besta nem a sua imagem e não receberam o sinal na fronte nem nas mãos; e reviveram e reinaram com Cristo durante mil anos."

Esta passagem descreve uma ressurreição dos mártires após a tribulação, que reinam com Cristo por mil anos. O Pós-Tribulacionismo encaixa essa ressurreição na cronologia dos eventos finais, após a Grande Tribulação.

Apocalipse 7:14 - "E respondi-lhe: meu Senhor, tu o sabes. Ele, então, me disse: São estes os que vêm da grande tribulação, lavaram suas vestiduras e as alvejaram no sangue do Cordeiro."

A menção da "grande tribulação" aqui ressoa com a visão pós-tribulacionista, que posiciona o arrebatamento após esse período de aflição.

1 Tessalonicenses 5:9 - "Porque Deus não nos destinou para a ira, mas para alcançarmos a salvação por nosso Senhor Jesus Cristo."

O Pós-Tribulacionismo considera que, embora os crentes possam passar pela tribulação, eles não são destinados à ira final de Deus, sendo preservados durante esse período.

Mateus 24:21 - "Porque haverá então grande tribulação, como nunca houve desde o princípio do mundo até agora, nem tampouco haverá jamais."

A referência à "grande tribulação" reforça a ideia de um período único de aflição global antes da volta de Cristo, que é um ponto central no Pós-Tribulacionismo.

Apocalipse 16:15 - "Eis que venho como vem o ladrão. Bem-aventurado aquele que vigia e guarda as suas vestes, para que não ande nu, e não se vejam as suas vergonhas."

A iminência da vinda de Cristo é enfatizada aqui, levando os crentes a estarem vigilantes e preparados, o que é consistente com a ideia de que a parousia acontecerá após a tribulação.

 A Abordagem Exegética de Daniel e Apocalipse

A perspectiva pós-tribulacionista também se apoia na análise de livros como Daniel e Apocalipse. O livro de Daniel, especialmente capítulos 7 e 9, aborda profecias sobre o fim dos tempos, incluindo a ascensão do Anticristo e eventos ligados à tribulação. O Apocalipse, escrito por João, é repleto de imagens simbólicas que retratam eventos finais, culminando na vinda gloriosa de Cristo. A conexão entre esses textos e a perspectiva pós-tribulacionista é estabelecida pela continuidade narrativa entre a tribulação e a parousia.

O Tempo da Tribulação e a Vinda de Cristo

A análise exegética do Pós-Tribulacionismo leva em consideração passagens como 1 Tessalonicenses 4:16-17, frequentemente associadas ao arrebatamento:

"Porquanto o Senhor mesmo, dada a sua palavra de ordem, ouvida a voz do arcanjo, e ressoada a trombeta de Deus, descerá dos céus, e os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro; depois, nós, os vivos, os que ficarmos, seremos arrebatados juntamente com eles, entre nuvens, para o encontro do Senhor nos ares, e, assim, estaremos para sempre com o Senhor."

A reconciliação entre o arrebatamento e a tribulação no Pós-Tribulacionismo é acentuada pela ideia de que os crentes não serão poupados da tribulação, mas serão preservados por Deus durante esse período, sendo arrebatados posteriormente.

Contexto Cultural e Literário na Interpretação

A abordagem exegética do Pós-Tribulacionismo enfatiza a importância de considerar o contexto cultural e literário ao interpretar as Escrituras. As imagens apocalípticas e os símbolos utilizados em textos como nos livros proféticos de Daniel e Apocalipse devem ser compreendidos à luz da cultura e do contexto do autor, evitando interpretações simplistas ou literalistas.

Conclusão

Em resumo, o Pós-Tribulacionismo é uma perspectiva escatológica que se apoia em uma análise exegética de passagens bíblicas, como Mateus 24, Daniel, Apocalipse e 1 Tessalonicenses 4:16-17. Ao examinar esses textos, a visão pós-tribulacionista defende que a volta de Cristo ocorrerá após a Grande Tribulação, e essa interpretação escatológica é ao meu ver a que mais se aproxima daquilo que as Escrituras nos dizem a respeito da Volta de Cristo. Contudo, é importante ressaltar que a escatologia é um assunto complexo, e diferentes perspectivas coexistem dentro do Cristianismo. Portanto, a busca por compreensão requer estudo, reflexão e abertura para diálogo. Em última análise, a esperança na segunda vinda de Cristo deve unir os crentes, independentemente das nuances de interpretação.

Diogo J. Soares

DIOGO J. SOARES

Doutor (Ph.D.) em Novo Testamento pelo Seminário Bíblico de São Paulo/SP (FETSB); Mestre (M.A.) em Teologia e Estudos Bíblicos pela Faculdade Teológica Integrada e graduado (Th.B.) pelo Seminário Unido do Rio de Janeiro. Possuí Especialização em Ciências Bíblicas e Interpretação pelo Seminário Teológico Filadelfia/PR (SETEFI). Bacharel (B.A.) em História Antiga, Social e Comparada pela Universidade de Uberaba (UNIUBE/MG). É teólogo, biblista, historiador e apologista cristão.

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